STF

A ministra Rosa Weber, do Supremo Tribunal Federal (STF), indeferiu pedido do procurador-geral da República, Augusto Aras, para arquivar o Inquérito (INQ) 4875, em que o presidente da República, Jair Bolsonaro, é investigado pela suposta prática de prevaricação no caso da negociação na compra da vacina indiana Covaxin. A ministra ressaltou que sua decisão não significa qualquer juízo antecipado sobre eventual culpabilidade do presidente. 

Em seu pedido, Augusto Aras concluiu que houve atipicidade da conduta atribuída a Bolsonaro, pois não estaria no rol das atribuições do presidente da República, previstas no artigo 84 da Constituição Federal (CF), encaminhar a denúncia.

Decisão antecipada 

A ministra Rosa Weber apontou que, como regra, a jurisprudência do STF considera inviável a recusa a pedido de arquivamento de inquérito ou de peças de informação solicitado pelo Ministério Público. Frisou, no entanto, que em duas situações cabe ao Supremo a apreciação do mérito do pedido: quando fundado na atipicidade penal da conduta ou na extinção da punibilidade do agente. 

Segundo a relatora, essa orientação se origina da circunstância de que, na hipótese de arquivamento fundado na inexistência de fato típico, é antecipada uma decisão que poderia ser tomada na fase inicial do feito, que é a absolvição sumária. 

“Não se cuida aqui, portanto, da controversa fiscalização do princípio da obrigatoriedade da ação penal, mas, sim, de verdadeiro julgamento antecipado do mérito da controvérsia criminal, atividade inequivocamente inserida nas atribuições do Estado-juiz”, assinalou. 

Inércia 

Para a ministra Rosa Weber, com base na alegação da PGR, o presidente da República estaria autorizado a permanecer inerte mesmo se formalmente comunicado da existência de crimes funcionais em pleno curso de execução no primeiro escalão governamental. 

A relatora destacou que, embora a gestão superior da administração envolva inúmeras decisões discricionárias, não há espaço para a inércia ou a liberdade de “não agir” no caso do exercício do controle da legalidade de atos administrativos e do poder disciplinar em face de desvios funcionais. 

De acordo com a ministra Rosa Weber, no ordenamento constitucional brasileiro, o presidente da República também é súdito das leis e não pode se furtar ao dever tanto de extirpar do sistema jurídico aqueles atos infralegais que se põem em antítese com as leis da República quanto de repreender, no plano disciplinar, os agentes do executivo transgressores do ordenamento jurídico. 

Probidade administrativa 

Ela ressaltou que tanto não há discricionariedade que a omissão presidencial caracterizada por não tornar efetiva a responsabilidade dos seus subordinados, quando manifesta em delitos funcionais ou na prática de atos contrários à Constituição, configura crime de responsabilidade atentatório à probidade administrativa, nos termos da Lei 1.079/1950. 

“Ao ser diretamente notificado sobre a prática de crimes funcionais (consumados ou em andamento) nas dependências da administração federal direta, ao presidente da República não assiste a prerrogativa da inércia nem o direito à letargia, senão o poder-dever de acionar os mecanismos de controle interno legalmente previstos, a fim de buscar interromper a ação criminosa – ou, se já consumada, refrear a propagação de seus efeitos –, de um lado, e de ‘tornar efetiva a responsabilidade dos seus subordinados’, de outro”, concluiu. 

A relatora frisou que sua decisão não viola a prerrogativa de independência funcional do Ministério Público, pois ela não compele o órgão a agir em qualquer direção, mas se limita a refutar o pretendido julgamento antecipado do mérito da causa penal.

De acordo com os autos, Bolsonaro teria sido informado sobre supostas irregularidades na compra de 20 milhões de doses da vacina Covaxin, mas não teria comunicado o fato aos órgãos de fiscalização ou de investigação criminal. Dessa forma, teria deixado de praticar, indevidamente, ato de ofício, para satisfazer interesse ou sentimento pessoal. 

Leia a íntegra da decisão.