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O presidente Jair Bolsonaro vai ser denunciado no Parlamento Europeu pela parlamentar sergipana, Maria Dantas, eleita deputada na Espanha pelo Esquerda Republicana em 2019. Um dossiê com 11 páginas já está pronto e será encaminhado aos 27 Estados-membros da União Europeia na próxima segunda-feira, 8. No documento, acusações contra o presidente do Brasil sobre assuntos como Combate ao coronavírus, Amazônia e povos indígenas.

O documento foi originalmente produzido em inglês, mas traduzido para várias línguas a exemplo do castelhano, catalão, francês e alemã. “A carta já foi enviada ao Parlamento Europeu, serão recolhidas adesões de parlamentares e posteriormente ela será enviada ao Comissário Europeu. Também será enviada a todos os Parlamentos nacionais de todos os Estados Membros da UE. A ideia é interpelar os meus pares dos Legislativos europeus para que façam instâncias aos seus Executivos, para que sejam criados intergrupos em comissão legislativa”, diz Maria Dantas.

Em trecho de carta que será enviada aos Estados-membro, Maria Dantas relata que o Brasil está caminhando para o topo da curva da pandemia em um contexto político que somente “piora a situação”.

Maria Dantas, sergipana, primeira brasileira a ser eleita deputada na Espanha – Divulgação

“Seu líder, o presidente Bolsonaro, faz campanhas diárias contra as medidas recomendadas pela OMS, boicotando as medidas de isolamento social tomadas pelos governadores e prefeitos, e faz campanhas diretas contra o isolamento social e incentiva manifestações para que as pessoas saiam de suas casas e voltem ao trabalho”, explica.

Leia abaixo a versão em português da carta de Maria Dantas, na íntegra:

Grito de alerta na Europa: Salvemos Brasil!

Carta aberta aos deputados e deputadas sobre a ação genocida e o ataque à democracia brasileira pelo governo de Jair Bolsonaro

“O Brasil acabou de passar de meio milhão de pessoas infectadas e tem 29.341 mortes confirmadas pela Covid-19, até o dia 31 de maio de 2020. A Agência Brasileira de Inteligência (ABIN) alertou a Presidência da República sobre a eficiência do confinamento diante da pandemia e a falta de UTIs em todo o Estado e o elevado número de subnotificações, alertando da enorme gravidade da situação. Mas o Brasil está caminhando ao topo da curva da pandemia em um contexto político, que somente piora a situação.

Por outro lado, a Amazônia brasileira, este ano, registrou níveis recordes de desmatamento ilegal e enfraquecimento das agências de proteção ambiental. 76 povos indígenas foram vítimas da pandemia, com 1.747 infecções e 167 mortes, espalhadas por 14 estados da federação brasileira, segundo a Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (APIB). Está claro que, para o governo Bolsonaro, todos os meios são válidos para sacrificar a Floresta Amazônica e os povos indígenas. Tudo isso por interesses econômicos.

Em meio a esse cenário de devastação, infelizmente o Brasil está liderado por negacionistas da crise climática e do coronavírus, que espalham teorias de conspiração e de terraplanismo, que convocam a extrema direita às ruas para acabar com o que chamam de “Comunismo”, “globalismo”, “ideologia de gênero”, “feminazis” e “anticristo”. Seu líder, o presidente Bolsonaro, faz campanhas diárias contra as medidas recomendadas pela OMS, boicotando as medidas de isolamento social tomadas pelos governadores e prefeitos, e faz campanhas diretas contra o isolamento social e incentiva manifestações para que as pessoas saiam de suas casas e voltem ao trabalho. Nesse sentido, ele demitiu o ministro da Saúde por ser contra suas ordens e por estar de acordo com a Organização Mundial da Saúde e, menos de um mês depois, um novo ministro da Saúde renunciou voluntariamente, porque de novo não queria seguir as suas ordens de incluir a hidroxicloroquina nos protocolos do Sistema Único de Saúde (SUS).

O ministro da Justiça e Segurança Pública também deixou o cargo e denunciou Bolsonaro por querer interferir na Polícia Federal. Depois disso, o Supremo Tribunal Federal solicitou como prova o vídeo da reunião ministerial de 22 de abril. Neste vídeo, podemos ver uma série de supostos crimes do presidente e de vários ministros, encontramos frases literais de Bolsonaro: “Quem não aceita minhas … minhas bandeiras (…): família, Deus, Brasil, armamento, liberdade de expressão, livre mercado, quem não aceita isso, está no governo errado. (…) Temos que abrir a questão das armas aqui! Quero todos armados! As pessoas armadas nunca serão escravizadas!”; do ministro do Meio Ambiente: “Precisamos fazer um esforço nosso aqui, enquanto estamos nesse momento de tranquilidade no aspecto de cobertura de imprensa, porque só fala de Covid, e ir passando a boiada e mudando todo o regramento e simplificando normas, (…) passar as reformas infralegais de desregulamentação, simplificação, todas as reformas … (falando da Amazônia) “; do ministro da Educação: “Eu, por mim, botava esses vagabundos todos na cadeia, começando no STF!” … ” Odeio o termo ‘povos indígenas’, odeio esse termo. Odeio. O ‘povo cigano’. Só tem um povo nesse país!”; da ministra da Mulher, da Família, dos Direitos Humanos: “Então, nós estamos fazendo um enfrentamento, mais de cinco procedimentos o nosso ministério já tomou iniciativa e nós tamos pedindo inclusive a prisão de alguns governadores”; do ministro da Economia: “Então tem que vender essa porra logo!” (sobre o Banco do Brasil) “; entre outros.

São 210 milhões de pessoas em mãos de uma gestão errática da pandemia e uma grave crise política e institucional. A revista britânica The Lancet, uma referência no mundo da Ciência e da Medicina, afirmou que “Bolsonaro é a maior ameaça à luta contra a Covidi-19 no Brasil”. O editorial destacou sua atitude contra o isolamento social, o desprezo pelas milhares de mortes, a crise política levantada pelo presidente em um contexto de pandemia, o desmantelamento da Ciência e da Saúde Pública, e fez clara alusão de que Bolsonaro deve mudar a sua atitude ou deixar o cargo. A revista está certa, porque Bolsonaro insiste em não aceitar as recomendações de especialistas, promove um medicamento potencialmente letal, segundo a OMS, e pressiona para que as empresas reabram e os trabalhadores voltem a seus postos de trabalho. A única preocupação do presidente é a economia, porque ele quer uma reeleição em 2022.

A atitude de clara relativização do período da ditadura brasileira, que forma o governo Bolsonaro, menciona ipsis litteris de Joseph Goebbels em vídeos oficiais, os insultos diários à imprensa, à classe política, à população negra, aos povos indígenas, à população LGTBIQ+, às mulheres, às pessoas pobres, compõem a ideologia e a encenação de um projeto de governo genocida, que usa ações de eugenia como políticas públicas.

Na mesa do presidente da Câmara dos Deputados do Brasil já existem mais de 36 pedidos de impeachment de Bolsonaro por vários grupos parlamentares e mais de 400 entidades da sociedade civil brasileira. Nas esferas jurídica, acadêmica, científica e social, vários manifestos foram feitos em rejeição ao governo Bolsonaro e um pedido de unidade de ação em defesa dos valores, princípios e estruturas republicanas do Brasil, que estão sendo eliminados por esse governo.

A comunidade internacional deve agir e tomar uma posição clara em relação ao governo do presidente Jair Bolsonaro diante do avanço da pandemia do Covid-19 no Brasil, do aumento do desmatamento na Amazônia e das ameaças aos direitos humanos e aos povos indígenas. Não pode ficar calada diante da situação do povo brasileiro quando, em poucas semanas, dois ministros da saúde deixaram o cargo, o ministro da Justiça renunciou devido à interferência do presidente na Polícia Federal, o ministro do Meio Ambiente quer tirar proveito da situação e expandir a mineração e a agricultura nas terras protegidas da Floresta Amazônica e o presidente quer “armar” a população para que possam ir às ruas contra o isolamento social.

Peço ajuda em face da ação genocida, do ataque à democracia, ao Estado de Direito e às estruturas republicanas brasileiras por Jair Bolsonaro e seu governo. Não se pode continuar aceitando tudo isso em silêncio. É necessária uma declaração de parlamentares de todo o mundo.

Madri, 31 de maio de 2020

Maria Dantas – Deputada do Congresso dos Deputados da Espanha
G.P. Republicano – ERC