Alessandro Vieira

O país está atordoado em meio à descrença na capacidade do presidente da República de se comportar à altura dos desafios nacionais e ao trauma do impeachment recente. Emprego, saúde e educação não viram avanço significativo. As reformas estruturais estão sendo feitas, apesar da inadequação do discurso presidencial, graças ao parlamentarismo branco que se impôs. Entretanto, nem o mais forte sentimento de medo de mudança consegue se sobrepor à frustração de se sentir enganado. 

Antonio Cruz / Agência Brasil

Os 57 milhões que foram às urnas votar em Jair Bolsonaro no segundo turno da eleição de 2018 acreditaram nas promessas de combate à corrupção, de dar fim aos privilégios, ao nepotismo. O lema era “Brasil acima de tudo”. Em 1º de janeiro, quando o presidente tomou posse, essas já eram palavras vazias. Perderam o sentido cedo, em 6 de dezembro de 2018, dia em que os brasileiros souberam que um certo Fabrício José Carlos de Queiroz, ex-assessor e ex-motorista de Flávio Bolsonaro, movimentou em conta o total de R$ 1.236.838,00. O hoje extinto Coaf considerou as operações suspeitas. 

Desde então, somos obrigados a conviver com uma forma de governar bastante distinta daquela prometida na campanha eleitoral. Instituições como a Receita Federal, a Polícia Federal e o próprio Coaf, que sobreviveram aos anos do mensalão e do petrolão, vêm sendo capturadas. O aparelhamento da Procuradoria-Geral da República, rompendo a tradição da lista tríplice, é o ponto mais recente do desmonte institucional, colocando em risco a garantia de que poderosos não estão acima da lei. 

O hoje ministro Sergio Moro, referência internacional de combate à corrupção, passa por um processo ostensivo de desmoralização, bancado por insólita aliança entre novos e velhos investigados. Assistimos, assim, à morte do projeto de combate à corrupção, a causa que moveu os eleitores de Jair Bolsonaro no segundo turno. Estou entre eles. 

A investigação do caso Queiroz tem oito meses e deveria ser simples. Trata de dinheiro nas mãos do ex-motorista de Flávio Bolsonaro, funcionários fantasmas, depósitos fracionados em espécie para o atual senador e cheques que somam R$ 24 mil para Michelle Bolsonaro.  A paralisação dessas apurações, além de expor de forma inequívoca um acordão firmado em Brasília, aponta, também, para a tentativa de erodir as instituições que permitiram que Lava-Jato e outras investigações do seu porte pudessem existir. É a desconstrução do sonho de um Brasil justo e ético. 

Não podemos tolerar a volta ao Brasil das gavetas, dos favores, das indicações políticas, do desrespeito às regras. As consequências desastrosas neste governo já são visíveis. Estão no preço do dólar, nas relações exteriores, no meio ambiente, na economia, na educação e na saúde. Para estes tantos problemas há esperança de recuperação. Mas é preciso desfazer ilusões: o presidente da República não está comprometido com o combate à corrupção. É ele próprio o maior entrave a essa tarefa da qual não podemos abdicar. 

Alessandro Vieira é senador (Cidadania-SE)